segunda-feira, julho 31, 2006

Ataque da aviação israelense mata mais de 50 civis


Bombardeio destrói prédio de três andares em Qana, sul do Líbano. Premier libanês classifica ação de "massacre israelense" e pede investigação internacional


BEIRUTE - A Cruz Vermelha libanesa confirmou 56 mortos, incluindo 34 crianças e 16 mulheres, na cidade de Qana, no sul do Líbano, após o bombardeio, neste domingo, da aviação israelense que atingiu um prédio de três andares. Segundo a organização humanitária, 18 pessoas encontradas num dos cômodos do prédio eram de duas famílias.

No prédio desta cidade situada a leste da localidade costeira de Tiro, viviam, além dos moradores habituais, várias famílias que abandonaram suas casas em outras cidades da região por medo dos intensos bombardeios da aviação de Israel.

A Cruz Vermelha estima que mais de 500 morreram no Líbano desde o início do conflito. Já o governo libanês eleva o número para 750.

Líbano protesta

O primeiro-ministro libanês Fouad Siniora reagiu imediatamente às mortes de dezenas de civis libaneses em Qana - que classificou de "novo massacre israelense" e "crime de guerra" - afirmando que agora o Líbano "somente aceitará um cessar-fogo incondicional".

Siniora fez esta declaração em entrevista coletiva após uma reunião com o presidente do Parlamento libanês, o xiita Nabih Berri, na qual exigiu também uma "investigação internacional" do grave incidente.

"Lançamos um grito a todos os libaneses, aos árabes e à humanidade, para que estejam conosco contra os criminosos de guerra israelenses", disse o primeiro-ministro libanês. "A partir desta manhã só será aceitável um cessar-fogo incondicional e o início de uma investigação internacional", afirmou.

Logo depois da declaração de Siniora, a emissora de TV libanesa Future informou que a secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, não visitará o Líbano após sua atual visita a Israel, e que "Beirute suspendeu as negociações" sobre o conflito com o Estado judeu até que se declare um cessar-fogo. O presidente do Líbano, Émile Lahoud, qualificou os ataques em Qana como uma "prova da barbárie israelense, apoiada por algumas potências".

Um porta-voz do Exército israelense responsabilizou o Hezbollah pela morte de civis em Qana, argumentando que a cidade foi atacada porque o grupo utiliza o local como base de lançamento de foguetes contra Israel.

quarta-feira, julho 26, 2006

Posto da ONU é bombardeado por Israel; 4 morrem

As quatro vítimas fatais eram funcionários das forças de paz da ONU no Líbano (Unifil); ainda não há informação sobre o que motivou o ataque.

BEIRUTE - Uma bomba israelense destruiu um posto de observação da ONU na fronteira entre o Líbano e Israel, matando quatro de seus funcionários, informou um porta-voz da entidade. Os mortos incluem observadores da Austrália, Canadá, China e Finlândia, disse uma autoridade militar libanesa sob condição de anonimato. O ataque atingiu ainda um bairro residencial e deixou seis civis mortos.

Em Roma, o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, foi questionado sobre o ataque logo após um jantar com a secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, e primeiro-ministro libanês, Fuad Saniora. Ele afirmou que o ataque foi "aparentemente deliberado" e exigiu uma investigação do governo israelense.

A afirmação de Annan foi prontamente rebatida pelo embaixador de Israel na ONU, Dan Gillerman, que expressou seu "profundo pesar" pelas mortes e negou que o ataque tenha sido intencional. "Estou chocado e profundamente chateado com a declaração precipitada do secretário-geral", disse ele, que classificou a afirmação de Annan como "prematura e errônea".

A bomba caiu precisamente sobre o prédio e abrigo que serve de base para uma força de observadores na cidade de Khiyam, localizada no extremo leste da fronteira entre Israel e Líbano, disse o porta-voz das forças de paz da ONU no Líbano (Unifil), Milos Struger.

"Há vítimas entre os observadores. A Unifil despachou um time de resgate ao local imediatamente, mas por enquanto eles não estão conseguindo retirar o entulho", disse Struger. Ainda segundo o porta-voz, o resgate foi dificultado porque os israelenses "continuaram atirando durante a operação de salvamento".

Com as informações sobre o ataque vindo a público, Annan deixou apresado o hotel em que havia se encontrado com Rice e Saniora em Roma. Minutos depois, o secretário-geral da ONU se pronunciou por meio de uma nota à imprensa: "Estou chocado com o ataque aparentemente deliberado das Forças de Defesa de Israel contra um posto de observação da ONU no sul do Líbano." Segundo a nota, o posto estava situado no local há muito tempo, e tinha as devidas identificações.

"Peço que o governo de Israel conduza uma investigação completa sobre o incidente", cobrou Annan. Gillerman, por sua vez, garantiu que o governo israelense realizará o inquérito, cujos resultados serão apresentados à ONU "assim que possível".

O embaixador americano na ONU, John Bolton, disse que o Conselho de Segurança foi informado sobre as mortes dos membros da Unifil. "Estamos obviamente muito tristes com a situação e tentaremos conseguir mais informações para confirmar a natureza do incidente", disse Bolton.

Desde que Israel lançou uma ofensiva militar massiva contra o Líbano e o Hezbollah, depois que militantes do grupo xiita mataram e capturaram soldados israelenses no último dia 12, um funcionário civil da Unifil e sua esposa morreram no fogo cruzado entre as forças israelenses e os guerrilheiros na cidade de Tiro, no sul do Líbano.

No ataque desta terça-feira, cinco soldados da Unifil e um observador militar também se feriram, informou Struger.

sexta-feira, julho 21, 2006

Avanço por terra pode custar caro a israelenses


Enquanto as pesquisas de opinião em Israel ainda mostram altos índices de aprovação popular da ofensiva no Líbano, analistas se perguntam se Israel está adotando a estratégia certa contra a milícia xiita Hezbollah.

O número de mortes do lado israelense - considerado alto para esse tipo de campanha - e as supostas falhas da inteligência sobre o número de militantes do Hezbollah escondidos em túneis e abrigos ao longo da fronteira com Israel estão sendo questionados por especialistas em estratégia de guerra.

De acordo com o correspondente da BBC Nick Childs, já há um consenso de que as forças israelenses terão de se concentrar nos ataques terrestres para ter alguma chance de sucesso na destruição do arsenal militar do Hezbollah. Mas uma operação como essas implicará altos riscos.

As tropas teriam de forçar os militantes a recuar em território libanês até que as cidades israelenses ficassem fora de alcance dos mísseis do Hezbollah, podendo sofrer muitas baixas durante o confronto.

Cara a cara


O líder da milícia xiita, Hassan Nasrallah, já deixou claro que quer enfrentar os israelenses cara a cara e fez provocações ao Exército de Israel, dizendo que os bombardeios não afetaram em nada a capacidade de combate de seu grupo.

O especialista em contra-terrorismo Boaz Ganor disse à Associated Press que o Hezbollah sabe como renovar seus estoques.

"É possível assumir que eles conseguirão mais foguetes do Irã e da Síria. Acredito que eles ainda tenham fôlego para semanas de combate. E, se receberem mais suprimentos, podem resistir por mais tempo", afirmou Ganor.

Apesar da destruição de estradas e aeroportos pelas Forças Aéreas de Israel e do bloqueio marítimo, ainda seria possível transportar armamentos em caminhões e pelas montanhas.

Ao longo dos anos, o Hezbollah desenvolveu estratégias para receber e esconder dinheiro e armas vindos do exterior.

Em entrevista à AP, o estrategista militar libanês Elias Hanna disse que é difícil usar inteligência militar contra um grupo como o Hezbollah porque ele se mostrou imune a infiltrações devido a um código severo de segurança e sigilo.

Tática de guerrilha


Vários dos militantes do Hezbollah são soldados com experiência de guerrilha acumulada em anos de combate contra as forças israelenses na fronteira.

Além disso, o grupo conta com as convicções religiosas de seus integrantes e apoio popular entre 1,2 milhão de muçulmanos xiitas no Líbano, especialmente no sul do país, onde os confrontos têm se concentrado.

Helmi Moussa, um analista do jornal de Beirute As-Safir, disse à AP que "a maior fraqueza de Israel é que ele ignora a magnitude dos recursos do Hezbollah".

"O grupo militante pode não ter uma força numerosa, mas é grande o suficiente para fazer cada passo do Exército israelense custar muito caro", disse ele.

Em 24 anos, Hezbollah virou influência regional




O Hezbollah – "Partido de Deus" – é uma força política e militar formada por muçulmanos xiitas, a comunidade mais numerosa no Líbano.

A organização nasceu em 1982, com apoio financeiro e logístico do Irã e com o objetivo de expulsar as tropas israelenses que haviam invadido o sul do Líbano.

Seu contingente chegava a quase 2 mil homens, a maioria da Guarda Revolucionária Iraniana, que haviam sido enviados ao Vale de Bekaa, no Líbano, para responder a Israel.

Esse objetivo inicial foi alcançado em 2000, graças, sobretudo, às ações do braço armado do grupo, a Resistência Islâmica.

Desde então, o Hezbollah sofre pressão para se integrar às Forças Armadas libanesas e se dedicar unicamente às suas ações políticas e sociais, menos conhecidas do mundo ocidental.

No Líbano, onde conta inclusive com importante presença parlamentar, o Hezbollah é muito respeitado. Sua reputação se deve aos serviços sociais e de saúde prestados à população. O grupo também tem um canal de televisão influente, o Al-Manar.

Apesar disso, o Hezbollah se recusa a abrir mão do seu braço armado, apesar da resolução 1559 da Organização das Nações Unidas, de 2004. Nela, a ONU pedia o desarmamento das milícias e a retirada de todas as forças estrangeiras (como cerca de 14 mil sírios) do Líbano.

Força regional

Capitalizando ganhos políticos e militares, o Hezbollah não se diz apenas uma força de resistência no Líbano, mas em toda a região.

Apesar de ter abandonado a concepção do Líbano como um Estado islâmico ao estilo iraniano, o partido continua professando a destruição de Israel.

A Resistência Islâmica continua ativa na tríplice fronteira com a Síria, especialmente perto da região de Sheeba, nas Colinas de Golã.

Desde 1967, Israel ocupa o lado sírio das colinas, o que na versão israelense e das Nações Unidas incluiria a área de Sheeba.

Contando com apoio político doméstico, o Hezbollah afirma que a região de Sheeba é uma área libanesa sob ocupação estrangeira.

A visão de Israel como um inimigo comum tradicionalmente levou o Hezbollah a defender interesses sírios contra o estado judeu. O governo de Damasco sempre foi um dos pilares de apoio do partido libanês.

Mas o balanço de forças foi alterado no ano passado, quando suspeitas de que a Síria estava por trás do assassinato do ex-primeiro-ministro Rafik Hariri, em fevereiro de 2005, arranharam a imagem de Damasco e geraram protestos em massa no Líbano.

Desde então, o Hezbollah se tornou a principal força política libanesa a partir de uma perspectiva própria, recebendo inclusive uma cadeira no Executivo libanês.

Para alguns analistas, o Hezbollah adotou uma posição mais cautelosa em relação à Síria. Além disso, o movimento passou a sublinhar a unidade libanesa contra a “presença ocidental” no país.